27 de abril de 2017

DISCOS DE VINIL # 29

DAVID BOWIE – DIAMOND DOGS (1974)



 Os jovens que acreditam que Lady Gaga inventou as regras para fazer um disco megalomaníaco certamente não ouviram este disco de David Bowie com a devida atenção! Se é que ouviram ou sabem da importância de Bowie para a música do planeta… Diamond Dogs, lançado pelo astro inglês em 24 de abril de 1974, não é apenas uma das maiores pirações musicais de Bowie, mas também se trata de um dos discos mais comentados de toda a história da música!


Antes de apontar os mitos e os fatos em torno deste clássico que completa 40 anos neste mês de abril, é preciso pensar o seguinte: qual era a pele que revestia o camaleão em 1974?


Bowie tinha “assassinado” Ziggy Stardust em cima do palco do Hammersmith Odeon, em julho de 1973. Gravou um delicioso disco de covers (Pin-Ups) para tentar se livrar do alienígena-personagem que encarnara com tamanha perfeição. Hunky Dory e The Man who Sold The World já tinham se tornado figuras de um passado distante. Dentro de dois anos criaria e encarnaria o retorno de “The Thin White Duke” e em menos de um ano deixaria as vestimentas de roqueiro para trás para viver um elegante Soulman que faria o som e a imagem do Plastic Soul de Young Americans (1975).



No entanto, qual foi a personagem escolhida por Bowie entre o período de 1973 e 1974? “Halloween Jack”, um cara bem legal que habita a apocalíptica e decadente Hunger City, tema de Diamond Dogs.


Na verdade, Jack não era nada mais, nada menos do que um espectro de Ziggy: o corte de cabelo (com direito ao mullet irreconhecível), a maquiagem, o olhar desafiador eram exatamente os mesmos que Bowie lançava mão dois anos antes. Qual foi a jogada de mestre de Bowie para que o assassinato de Ziggy Stardust realmente fizesse sentido: um álbum conceitual!


A ideia inicial de David Bowie era fazer uma espécie de Opera Rock de 1984, obra-prima do escritor George Orwell. No entanto, a esposa de Orwell negou os direitos ao Camaleão inglês, que decidiu fazer uma alegoria das ideias do escritor em seu disco. Além disto, Bowie dispensou todos os seus colegas do “The Spiders from Mars” antes da gravação de Diamond Dogs.



Os fãs e os críticos sentiram grande falta do genial Mick Ronson, que tinha um estilo único ao dedilhar as cordas de uma guitarra, além de ser um instrumentista de mão cheia. A sonoridade do álbum ficou bastante crua no que diz respeito aos acordes de guitarra, apesar de Bowie se revezar entre guitarras, saxofones e teclados moog e mellotron e dos arranjos de cordas de Tony Visconti para a faixa “1984”. As influências do som dos Rolling Stones, para a felicidade dos amantes do bom Rock, ainda estavam lá (os riffs de guitarra da faixa-título e de “Rebel Rebel” refletem este fato com perfeição). No lugar das visões oníricas de “Ziggy Stardust” e “Aladdin Sane”, visões niilistas do caos urbano e das paranóias humanas (insufladas pelos abusos de cocaína cometidos por David Bowie himself)…


Para dar a imagem definitiva do habitante mais ilustre da Hunger City que se esvai em genocídio, enquanto o Big Brother observa todos os acontecimentos com o seu olhar atento, o artista plástico Guy Peellaert pintou uma criatura híbrida para a imagem da capa do disco: um cão com a genitália à mostra que tinha o rosto de Halloween Jack! O choque, obviamente, não se deu com o fato do cachorro estampar o rosto de David Bowie, mas aconteceu pelo fato de que havia um órgão sexual visível para quem visse a capa de Diamond Dogs. A capa, obviamente, foi censurada. As fotos da sessão que mostra Bowie segurando um cão enfurecido e prestes a atacar o primeiro indivíduo que estivesse ao alcance de suas mandíbulas nem sequer foram utilizadas para o mesmo fim do trabalho de Peelaert. Enquanto isso, cópias da edição original do disco são vendidas por quantias altíssimas no mercado negro.




A turnê resultante do disco teve início em julho de 1974 e rendeu o primeiro álbum ao vivo de Bowie, David Live (1974). A Hunger City foi recriada nos palcos com direito a um cenário baseado em Metropolis, do diretor alemão Fritz Lang. Foi, sem dúvida, a turnê mais ambiciosa de David Bowie até o momento. Músicos de primeira qualidade como o maestro e pianista Michael Kamen (e diretor musical do show), o tecladista Mike Garson, o guitarrista Earl Slick, o baixista Herbie Flowers, o baterista Tony Newman e o saxofonista David Sanborn, dentre outros, foram convocados para a Diamond Dogs Tour.


Os shows da turnê foram o marco da transição do arauto do Glam Rock para o Soulman esquelético e branco que sacudiu o planeta com uma música negra de altíssima qualidade. A foto que ilustra a capa traz um Bowie magérrimo, vestido com um belo terno azul bebê e que não lembra em nada a imagem de Ziggy Stardust. O alienígena, enfim, estava morto!






Menos de um ano depois de Diamond Dogs, a música de David Bowie tinha sofrido uma mutação tão radical quanto as trocas de pele de seu criador. A partir deste disco conceitual, o astro inglês estava pronto para viver intensamente uma mudança radical na música que estava fazendo a partir de 1974-1975. O resultado disto? O antológico Young Americans, que daria um novo direcionamento para a música de um dos artistas mais geniais de todos os tempos...