30 de janeiro de 2017

TROVA # 109

AS PONTES DA AMIZADE



“Some people go to priests; others to poetry; I to my friends. The beauty of the world, which is so soon to perish, has two edges, one of laughter, one of anguish, cutting the heart asunder. If you do not tell the truth about yourself, you cannot tell it about people.”
(Virginia Woolf)



Estou longe de ser um tipo, digamos, popular: não tenho um milhão de amigos, porém sou bastante grato a cada uma das amizades que tenho e não posso deixar de agradecer aos que um dia me concederam doces momentos em parceria. Afinal, devo muito do que sou hoje aos encontros e desencontros que a vida me proporcionou em 30 e poucos anos de caminhada.


Quando era mais jovem, meu temperamento forte, introspectivo e sensível contrastava com a tendência expansiva de membros de minha família: eu vivia em meus universos paralelos que cabiam dentro do meu antigo quarto, enquanto o mundo de meu irmão mais novo não cabia dentro das quatro paredes de nosso velho apartamento, já que ele vivia na rua e era uma das pessoas mais populares do pedaço, enquanto eu sempre colecionei os frutos da minha impopularidade.


Amizades são como pontes: elas sempre te levam para algum lugar, seja o destino final bom ou ruim. Quando há um sentimento verdadeiro, podemos alcançar lugares infinitos dentro das relações humanas. Por outro lado, no momento em que o interesse, a conveniência e a falsidade entram em cena, falsos amigos possuem máscaras de péssima qualidade e que, um dia, caem. Depois dos 35 anos de idade, busco relações mais sólidas, maior qualidade de vida, amigos com a possibilidade de agregar algo de bom. Quero um amigo inteiro e não pela metade.


Como eu sempre fui um ancião aprisionado em um corpo de jovem, meu desconforto com o mundo diminuiu um pouco quando fui para a Faculdade de Letras, um terreno supostamente livre de preconceitos de quaisquer tipos. O fato de pessoas de variadas faixas etárias estudarem juntas me fez sentir mais à vontade dentro da sala de aula, algo inédito para mim até então. Carrego amizades, colegas e umas duas ou três paixões um tanto secretas no meu convívio pessoal e dentro do meu peito até hoje.


Ao trocar o Rio de Janeiro por são Paulo no início de 2006, pensei que não sobreviveria à mudança para uma cidade tão diferente da minha terra natal. Consegui me adaptar completamente graças às amizades que fiz e aos velhos companheiros que não me abandonaram apesar da distância. Foi a partir da vida adulta que pude entender o sentido do ditado “Quem tem amigos não morre pagão”.


O mundo da música, por exemplo, já nos ofertou amizades inesquecíveis: John Lennon e Paul McCartney fizeram a trilha sonora de várias gerações à frente dos Beatles. Mick Jagger e Keith Richards colocaram os egos e às mágoas de lado em nome de mais de cinco décadas de carreira dos Rolling Stones. Antônio Carlos Jobim e Vinícius de Moraes fizeram de sua relação uma parceria que levou a música brasileira para o mundo inteiro. Roberto Carlos, Erasmo Carlos, Caetano Veloso e Gilberto Gil modernizaram a canção brasileira graças a mais de 50 anos de amizade.



Estes exemplos nos mostram que amizades genuínas sobrevivem a brigas, cobranças, disputas de ego, distâncias e o próprio tempo. É preciso buscar inspiração nestas pessoas para que possamos viver de maneira mais leve, alegre e plena. Isso acontece se tivermos amizades que podemos contar nas pontas dos dedos ou um milhão de amigos...